sexta-feira, 16 de julho de 2010

Compra de terra por estrangeiros - análise das restrições existentes

Atualização. Em junho de 2011, proferi uma palestra sobre proteção dos investidores estrangeiros no Brasil, que também tratou sobre esse tema. O link está aqui.


Ao fim desse texto, incluí uma parte da referida palestra, em que falo sobre   COMO EMPRESAS BRASILEIRAS DE CAPITAL ESTRANGEIRO PODEM POSSUIR OU CONTROLAR TERRAS RURAIS NO BRASIL. Veja ao final.

Recentemente, circularam notícias com o seguinte teor:

"Empresas brasileiras com capital estrangeiro terão as operações de compra de terras rastreadas no Brasil. A corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou ontem que os cartórios de notas e de registro de imóveis repassem informações sobre esse tipo de negócio a cada três meses. A medida aumenta o controle do avanço estrangeiro sobre o território brasileiro. Atualmente, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) registra apenas a compra de terras diretamente por pessoas físicas ou empresas estrangeiras. (Fonte- Agência Estado)"

Entretanto, essas notícias deixam escapar o principal. O CNJ não pretende somente catalogar as terras em mãos de estrangeiros, mas realmente LIMITAR e PROIBIR a aquisição de terras por pessoas jurídicas brasileiras controladas por capital estrangeiro.

PARA ENTENDER A QUESTÃO:

A lei 5.709 de 1971, diploma da época da ditadura, proibia a aquisição de grandes lotes de terra por pessoas físicas estrangeiras, pessoas jurídicas estrangeiras e pessoas jurídicas brasileiras com capital predominantemente estrangeiro.

O foco da questão é a limitação de compra por empresas brasileiras de capital estrangeiro. Veja-se bem, essa limitação é claramente discriminatória, porque a pessoa jurídica brasileira é brasileira (!), independentemente da origem de seu capital.

Num exemplo simplista, seria como proibir brasileiros de pais europeus que adquirisse bem imóveis, por suspeita de uma possível "contaminação" dos interesses do brasileiro por uma "malévola" influência estrangeira.

Pois bem, essa aberração de iniquidade só subsistia porque a própria Constituição definia a diferença entre empresas brasileiras de capital nacional e de capital estrangeiro (CR, Art. 171).

Mas, pela boa obra dos legisladores, o referido artigo 171 foi revogado. Ou seja, perante a constituição não pode haver diferença entre empresas brasileiras. Reina o princípio de que todos são iguais perante a lei.

Com isso, encerrou-se o assunto. Qualquer discriminação quanto à origem do capital passa a ser ilegal, inconstitucional.

Aliás, o absurdo da situação não poderia ser mais claro: Como a opinião pública reagiria se a injustiça tivesse sido cometida no sentido contrário? Isto é, se a partir de amanhã somente empresas brasileiras de capital estrangeiro pudessem adquirir terras?

CNJ PROIBE AQUISIÇÃO POR VIAS INDIRETAS

Leia-se com calma o que o CNJ noticiou em seu WEB Site:

"No entendimento da Corregedoria Nacional de Justiça os cartórios extrajudiciais de notas e de registro de imóveis estão submetidos às regras e procedimentos disciplinados na Lei n. 5.709, de 1971. De acordo com a lei, se os tabeliães não prestarem as informações estarão sujeitos à perda do cargo. As aquisições de terras podem ser anuladas, caso sejam denunciadas e comprovadas irregularidades nos limites impostos pela legislação."

Os limites a que se refere o CNJ não são a mera exigência de declaração e registro. O Art. 10 da lei é bem claro ao mencionar que os cartórios deverão manter em registro a "Autorização do órgão competente, quando for o caso.

Art. 10 - Os Cartórios de Registro de Imóveis manterão cadastro especial, em livro auxiliar, das aquisições de terras rurais por pessoas estrangeiras, físicas e jurídicas, no qual deverá constar:
I - menção do documento de identidade das partes contratantes ou dos respectivos atos de constituição, se pessoas jurídicas;
II - memorial descritivo do imóvel, com área, características, limites e confrontações; e
III - transcrição da autorização do órgão competente, quando for o caso.

Essa autorização é necessária em vários casos. Por exemplo, sempre que as pessoas jurídicas estrangeiras (ou brasileiras de capital nacional) desejarem adquirir imóveis rurais:

Art. 5º - As pessoas jurídicas estrangeiras referidas no art. 1º desta Lei só poderão adquirir imóveis rurais destinados à implantação de projetos agrícolas, pecuários, industriais, ou de colonização, vinculados aos seus objetivos estatutários.

§ 1º - Os projetos de que trata este artigo deverão ser aprovados pelo Ministério da Agricultura, ouvido o órgão federal competente de desenvolvimento regional na respectiva área.

Para quem tem olhos e quer ver, a consequência é clara. O CNJ, que deveria garantir o funcionamento da justiça, está repristinando uma limitação inconstitucional.

Ora, esse ímpeto regulatório do CNJ tem endereço certo. A Amazônia, que o governo tenta de todas as maneiras cercar à influência estrangeiras.

E o Governo foi ardiloso, uma fez que, juntamente com essa iniciativa, promulgou a lei 12.249. Esta lei, num de seus numerosos artigos, impõe restrições ao empréstimo de empresas estrangeiras às suas controladas e coligadas no Brasil. Ou seja, o governo não só tenta evitar a compra com capital estrangeiro trazido ao Brasil, mas, antecipando-se a uma estratégia comum, impede que empresas estrangeiras financiem, através de empréstimos, a aquisição de terras em solo nacional.

Infelizmente, por mais bem intencionadas que possam ser as ações do governo nesse tema, elas estão completamente mal orientadas. Este texto abster-se-á de comentar o caso sob o ponto de vista da teoria econômica e das consequências funestas de uma limitação arbitrária de mercado. Os economistas se encarregarão de demonstrar essa verdade pela milésima vez.

Contudo, sob o ponto de vista do Direito e da Justiça, é deve falar: nenhuma limitação baseada em premissas inconstitucionais deve subsistir. As empresas brasileiras que se sentirem prejudicadas devem procurar a justiça, que certamente impedirá que uma manobra burocrática solape garantias constitucionais.

_________


Atualização. Em junho de 2011, proferi uma palestra sobre proteção dos investidores estrangeiros no Brasil, que também tratou sobre esse tema. O link está aqui.

Ao fim desse texto, incluí uma parte da referida palestra, em que falo sobre   COMO EMPRESAS BRASILEIRAS DE CAPITAL ESTRANGEIRO PODEM POSSUIR OU CONTROLAR TERRAS RURAIS NO BRASIL. Veja a seguir:



OMO EMPRESAS BRASILEIRAS DE CAPITAL ESTRANGEIRO PODEM POSSUIR OU CONTROLAR TERRAS RURAIS NO BRASIL

ATRAVÉS DE UM ACORDO DE ACIONISTAS

A empresa estrangeira pode, por meio de um bom acordo de acionistas, prever que, apesar de ter menos do que a maioria das cotas, seu direito a voto e seus direitos de distribuição de lucros serão, de fato, majoritários. Isso garantirá ao investidor estrangeiro o controle do investimento e o recebimento de lucros, sem violar a lei brasileira.

POR MEIO DE ARRENDAMENTOS RURAIS QUASE PERPÉTUOS

Desde que os arrendamentos sejam celebrados por meio de empresas com maioria de capital nacional, mas controladas de fato por estrangeiros, como acima.

POR MEIO DE DIREITOS DE SUPERFÍCIE, USUFRUTOS E PARCERIAS AGRÍCOLAS

Através do uso dos institutos acima, os estrangeiros podem ter, virtualmente, o controle pleno da terra por períodos de 20 até 100 anos. Muito embora não correspondam exatamente ao Direito de Propriedade, deve-se lembrar que grande parte dos investimentos estrangeiros em terras visam a ganhos no prazo de 10 a 30 anos e posterior revenda. Ou seja, para os estrangeiros, a solução acima é plenamente válida.

REGISTRAR E ENTRAR NA JUSTIÇA;

Uma vez que os Cartórios são vinculados aos governos Estaduais (via Tribunais de Justiça), éconcebível que a empresa brasileira venha a comprar a terra, depois alterar o contrato social , cedendo as cotas a estrangeiros. Se o governo federal questionar a operação, é possível acionar a justiça, alegando a inconstitucionalidade das proibições, através de inúmeras ações.  No mínimo, o investidor ganhará 5 anos de propriedade. Se a lei prevalecer, a ação será julgada procedente e o estrangeiro permanecerá na terra.

ABRINDO UM BANCO NO BRASIL, E FAZENDO TUDO ISSO JUNTO, EM BOLSA DE VALORES

Através de operações mais complexas, envolvendo financiamentos, fundos de investimento em bolsa e securitização de direitos reais, é possível organizar um mercado inteiro baseado na venda ou controle de terras a estrangeiros. Embora essa opção não seja a mais viável economicamente, ela demonstra o quanto a posição do governo é dúbia, vacilante e parcial. Ora, se bancos de capital estrangeiro podem através de operações financeiras,controlar fazendas, por que as empresas produtivas estrangeiras não poderiam fazer o mesmo?

MEIOS ILEGAIS NÃO SÃO NECESSÁRIOS.

O uso de "laranjas", a prestação de declarações falsas, a celebração de casamentos fajutos a fim de obter vistos permanentes, nada disso é necessário. Nestas práticas residiria a ilegalidade. E, com certeza, são estes os exemplos que grupos sociais mal informados e setores tradicionalistas do governo utilizarão para enganar o público. Não façam isso.

ATRAIAM O INVESTIMENTO. A AMAZÔNIA SEM USO NÃO VALE NADA.

Por outro lado, usem os meios legais acima. Atraiam o investimento. Como citei em minha palestra, no início do post, ideologias nacionalistas não enchem a barriga do povo. Investimentos reais na produção agrícola podem, pelo menos, ajudar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários servem para discussões teóricas e para comentários políticos e econômicos. Se você precisa de auxílio em matérias de Direito Internacional, escreva para contato@adler.net.br.